Homem assume vaga de cotas raciais no TCE após declarar que se ‘bronzeia com facilidade’

Ele recorreu alegando ter tido um avô pardo, e apresentou um laudo médico que diz que ele tem a pele morena que bronzeia com facilidade, e conseguiu.

Um candidato conseguiu tomar posse no Tribunal de Contas do Estado (TCE-BA) como homem negro, mesmo após a banca de heteroidentificação do concurso ter afirmado que ele é um homem branco. Bruno Gonçalves Cabral, 35 anos, diz ser pardo e solicitou uma liminar para assumir a vaga, mas o pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça. Ele recorreu alegando ter tido um avô pardo, e apresentou um laudo médico que diz que ele tem a pele morena que bronzeia com facilidade, e conseguiu. 

A juíza Maria do Rosário Passos da Silva Calixto suspendeu as decisões da comissão de heteroidentificação e determinou o retorno provisório do candidato para a lista de aprovados cotistas negros, até que haja uma decisão de mérito pelo juiz de primeiro grau. A vaga é para Auditor Estadual de Controle Externo. Na decisão, a juíza reproduziu a conclusão da banca examinadora do concurso.

“De acordo com análise do fenótipo do candidato Bruno Gonçalves Cabral, foi verificado que o mesmo possui: pele branca, nariz alongado, boca com traços afilados e cabelos naturalmente não crespos. Tais características o enquadram, no fenótipo de uma pessoa socialmente branca, não passível de sofrer discriminação por cor/raça ou etnia, diante da aparência que assim apresenta”, afirmam os examinadores.

A banca de heretoindentificação conclui. “Dessa forma, rejeitamos a autodeclaração do candidato supracitado, uma vez que seu fenótipo não foi identificado, por esta comissão de heteroidentificação, integralmente ou em sua maioria, condizente às pessoas da população negra (pretos e pardos)”, diz o parecer. 

A juíza afirma que o texto dos examinadores é igual ao usado para dispensar outros candidatos no mesmo concurso, lembra que não compete ao judiciário substituir a banca examinadora, mas que cabe a análise da legalidade do ato. Ela afirma que Bruno disse ter tido um avô e uma tia pardos, que o candidato apresentou um laudo dermatológico que diz que ele tem a pele morena que bronzeia com facilidade e concedeu a liminar. Maria do Rosário afirma que a decisão é parcial, enquanto o mérito é julgado pelo primeiro juiz do caso. 

Na ampla concorrência, Bruno ficou em 45º lugar e não conseguiria ser aprovado. Entre cotistas, ele ocupa a 8ª posição, sendo o penúltimo do ranking das vagas disponíveis para esse público. Procurado, Bruno Cabral afirmou que é uma pessoa parda, que a decisão da banca foi equivocada e que aguarda o julgamento. 

“Assumi na condição de pessoa parda, previsto na legislação. As justificativas da banca não se sustentam ao falar que tenho pele branca e lábios finos e rosados. Qualquer pessoa ao meu redor vê claramente uma pessoa parda. Por hora, o julgador concordou com as provas apresentadas, mas o processo ainda está em andamento. Além disso, outras pessoas com fenótipo próximo ao meu tiveram a autodeclaração aceita”, afirmou. 

Candidatos negros reclamaram dele ter tomado posse. Bruno prestou concurso também para Agente de Tributos Estaduais da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, em 2022, e para Técnico em Informações Geográficas e Estatísticas do IBGE, em 2016, onde havia vagas para pessoas negras, mas ele optou pela ampla concorrência. Ele disse que não usou as cotas nesses certames porque desconhecia o próprio direito. Bruno disse que a banca também recusou a autodeclaracão de um atual servidor do TCE, no ano anterior, em processo seletivo diferente, e que o órgão age de modo arbitrário.

“Esta mesma banca, identificou como negro pardo, indivíduos com características idênticas às minhas nesse mesmo processo do TCE: cor de pele, tipo de boca e tipo de cabelo”. E concluiu. “A banca não afirmou que sou branco, mas ‘socialmente branco’, construção ideológica da instituição, o que fere ainda mais minha história de vida”, disse.

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