Santa Dulce dos Pobres vira ícone pop

Foto: Walmi Cirne
Foto: Walmi Cirne

O paulistano Eduardo Kobra, nascido Carlos Eduardo Fernandes, é, ao lado da dupla de irmãos Os Gêmeos (Gustavo e Otávio Pandolfo, também paulistas), um dos mais renomados e reconhecidos muralistas brasileiros.

Com obras em grandes metrópoles do mundo como Amsterdam, Nova Iorque, São Paulo, Rio de Janeiro, Lisboa e Paris, dentre outras cidades, o grafiteiro finalmente chega a Salvador para colocar a capital baiana no circuito internacional da arte de rua.

Uma das fachadas laterais do Shopping Barra (Av. Centenário, Chame Chame) vai servir de tela para que o artista possa deixar, pela primeira vez, sua arte urbana na cidade.

O painel terá mais de 300 metros quadrados (9,33 de largura e 33 de altura) e será baseado em uma foto de Irmã Dulce com uma criança. Vai levar cerca de 10 a 15 dias ininterruptos para ficar pronto, começa a ser feito hoje mesmo e foi um convite do próprio estabelecimento ao artista.

“Hoje tenho o privilégio de escolher as obras que quero fazer e Irmã Dulce foi uma escolha pessoal por ser uma brasileira que doou sua vida para as pessoas mais humildes. Ela se encaixa no meu projeto Olhares da Paz (que tem, dentre outros, Ghandi, Madre Tereza de Calcutá, Martin Luther King e Mandela). E o que acho mais importante é que os princípios e valores do meu trabalho foram preservados”, explicou Kobra, que contou com o aval de Maria Rita, superintendente da Osid (Obras Sociais Irmã Dulce), em coletiva de imprensa realizada na manhã de ontem no Barra.

Com grafites que resgatam a memória dos lugares e transformam espaços neutros em grandes obras de arte facilmente identificadas pelas cores fortes, riqueza de detalhes e precisão dos traços, o artista teve, em 2017, um de seus painéis em São Paulo desfeitos por ordem do governador João Dória.

“Apagar qualquer arte, para mim, é um crime. As autoridades precisam entender a importância desse tipo de arte, que é pública e contribui para o espaço urbano”, desabafou o muralista.

Para o presidente da Amabarra (Associação de Moradores e Amigos da Barra), Waldson Campos, muitos locais aproveitam a arte urbana para desenvolver o turismo.

“O grafite é um tipo de arte que todos têm acesso porque é na rua. Com a arte de rua, o sentido de pertencimento dos moradores é muito maior”, acredita Campos.

Retratista

Dentre os trabalhos mais famosos de Kobra está O Beijo, uma releitura da icônica fotografia do jornalista norte-americano Alfred Eisenstaedt, feita em agosto de 1945, para comemorar a vitória dos Estados Unidos sobre o Japão na Segunda Guerra Mundial.

Este mural de 11 metros de altura por 17 de largura estava estrategicamente posicionado em um dos mais badalados espaços de Manhattan, o jardim suspenso High Line, mas foi apagado quatro anos após ter sido criado. No entanto, ainda assim, o muralista tem, atualmente, quase duas dezenas de murais somente em Nova Iorque.

Kobra também é conhecido por retratar personalidades históricas como o pianista Arthur Rubinstein, que está em um mural em Lodz, na Polônia, o cacique Raoni (em Portugal) o líder sul africano Nelson Mandela (Malaui), o pintor surrealista Salvador Dalí (Espanha), o músico Bob Dylan (Estados Unidos), o grupo de rap paulista Racionais e o arquiteto Oscar Niemeyer (São Paulo), a escritora Anne Frank (em Amsterdam, Holanda), o poeta Mário Quintana (Porto Alegre), e muitas outras.

Além disso, o artista brasileiro detém a marca dos dois maiores murais grafitados do mundo e está no Guinness Book, o livro dos recordes.

Um é o Etnias, com 15 metros de altura e 170 de comprimento, realizado para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, e o outro, de 2017, é uma obra em referência ao chocolate, que ocupa um paredão de 5.742 metros quadrados na Região Metropolitana de São Paulo.

Com uma agenda repleta de propostas de trabalho, depois de Salvador Kobra deve fazer um mural em Brasília, representando os candangos, e outro em Porto Alegre sobre a história da cidade. Em fevereiro, parte para deixar seus traços firmes e cheios de cores em mais algumas paredes dos Estados Unidos.

“As cidades devem incentivar os artistas que, muitas vezes, precisam de espaço e material para desenvolver seu trabalho. Todo artista modifica as ruas para melhor”, conclui, sabiamente, o grafiteiro. (A tarde)

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