4 truques psicológicos que explicam o sucesso da Black Friday

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Enquanto uma parcela razoável da população está ansiosa à espera dos descontos monumentais da Black Friday, há um grupo seleto de economistas e psicólogos que aguardam o final de novembro por outro motivo: a data é um enorme (e imprevisível) experimento científico de economia comportamental, em que se joga dinheiro fora a rodo, de maneira irracional.

Pesquisadores como Richard Thaler – que levou um Nobel em outubro – fizeram história ao somar as nuances do comportamento humano à teoria econômica clássica. E é justamente em cima dessa união entre psicologia e dinheiro que as lojas trabalham para te convencer de que vale a pena torrar todas as moedas do porquinho em um dia só. Mesmo quando os descontos não estão tão bons assim.

A SUPER listou alguns dos fenômenos que te emburrecem quando você está na porta da loja, esperando ela abrir e virar palco de brigas por ferros de passar.

Descontos são relativos

Se um produto custa R$ 20 em uma loja e R$ 30 na outra, você não tem dúvida: vai direto na primeira. Afinal, é uma diferença de preço considerável. Por outro lado, se um produto custa R$ 4490 em uma loja e R$ 5000 na outra, é bem provável que você nem perceba a diferença de valores. Talvez um amigo seu até diga que a segunda é mais honesta, por arredondar o preço.

Acontece que nos dois casos a diferença é a mesma: 10 reais. O que dá duas passagens de ônibus. Ou um café com pão de queijo na padaria. Pena que nosso cérebro não quer saber: ele trabalha com porcentagens, não com o valor em si.  

Esse fenômeno está no cerne da Black Friday, em que é comum chutar o balde logo cedo – e sair na rua com uma geladeira nas costas às oito da manhã. Depois de deixar R$ 2000 em uma loja, todos os outros preços vão parecer melhores do que são de verdade. Camiseta por R$ 50? Leva. Celular por R$ 800? Leva também. Você, por mais pão duro que seja, vai no embalo da compra de maior porte – e se esquece do quanto realmente custa cada item menor.

Se todo mundo se jogar pela janela, você se joga também

Gastar dinheiro é um negócio que dói. Quem tem um filho que gosta de Kinder Ovo sabe bem disso.

Acontece que dói bem menos quando você olha em volta e todo mundo está fazendo a mesma coisa. Um artigo científico de 2009, da Universidade da Carolina do Norte, concluiu que nós não agimos de forma pouco ética só quando o custo benefício da ação é bom. Nós também nos baseamos no comportamento de quem está em volta, mesmo que de maneira inconsciente.

É claro que gastar dinheiro não é antiético. Mas é algo que te deixa culpado, com peso na consciência. Que te faz pensar duas vezes. Quando todos os vizinhos estão chegando em casa com TVs, porém, você tende a pensar que comprar algo um pouco mais barato – digamos, uma torradeira – não é tão grave assim.

A impressão geral é mais forte que as impressões específicas

Esse é um fenômeno chamado por psicólogos de “Halo effect”. Foi cunhado por Edward Thorndike em um artigo de 1920, chamado O Erro Constante nas Avaliações Psicológicas.

A ideia é simples, e já foi verificada experimentalmente várias vezes.

Se você pedir a funcionários de uma empresa que avaliem seus colegas de acordo com uma lista de qualidades e defeitos bem específicos (como inteligência, aparência física, capacidade de liderança, confiabilidade etc.), há uma tendência a que um pequeno grupo de pessoas seja muito bem avaliada em todas as categorias – mesmo que seja altamente improvável, do ponto de vista estatístico, que uma só pessoa seja ao mesmo tempo inteligente, confiável, bonita etc.

Isso acontece porque a boa impressão geral que essas pessoas passam convence os colegas de que elas são boas em tudo – mesmo que na prática não seja bem assim. Pelo mesmo raciocínio, pessoas pouco populares serão avaliadas de forma injusta em categorias em que, na verdade, se destacam.

Na Black Friday é parecido: os lojistas podem praticar preços que na verdade nem são tão bons assim. Eles se reverterão em vendas do mesmo jeito, porque pegam carona na boa impressão que o dia transmite, cultivada há anos em promessas de preço baixo e economia.

É mais fácil te pegar quando você está cansado, de cabeça cheia

Às vezes, você já parou para pensar em toda a lista acima. E é mesmo um comprador racional em ocasiões normais. Mas a arma mais letal da Black Friday é justamente criar situações que te impedem de ser ponderado e racional. Ela ocorre no final da semana, quando você já está cansado. Te obriga a acordar cedo, o que te deixa meio zonzo. Te faz lidar com outros consumidores que não estão exatamente em um clima diplomático – o que te torna mais propenso a ficar de saco cheio com quem está na sua frente na fila. E inunda seu Facebook de ofertas das mais variadas, o que te obriga a decidir entre um enorme número de produtos muito diferentes entre si.

Um artigo científico publicado pela Universidade Estadual da Flórida demonstrou que pessoas esgotadas mentalmente – do jeito que você fica depois de um longo de trabalho – são péssimas em tomar decisões. Isso acontece porque ter autocontrole é cansativo: você se segura uma vez. Duas. Na terceira, já se torna três mais propenso tanto a cometer atitudes desonestas como a cair no papo de pessoas que querem te passar a perna.

É claro que o teste acima não foi feito especificamente para compras: vale para golpes e jeitinhos em geral. Mas os descontos da Black Friday, muitas vezes, não são tão honestos assim, e te convencem justamente na base da insistência. Fica a dica: tome um banho e esfrie a cabeça antes de digitar o número do cartão.

Informações: Superinteressante / por Bruno Vaiano

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