A menos de 40 dias da eleição presidencial, banqueiros e empresários se mostram perplexos diante da ausência de propostas concretas para estimular a economia nos planos de governo apresentados pelas campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Dirigentes e economistas de grandes instituições financeiras, líderes da indústria, do comércio e do setor de serviços dizem que “vêm tentando arrancar” dos dois candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto medidas para reaquecer o PIB.
A Folha ouviu, sob condição de anonimato, seis banqueiros, dois grandes empresários da indústria, outros dois do varejo e um do setor de serviços. Também entrevistou dirigentes de associações, analistas e economistas de bancos de investimento e corretoras.
Reservadamente, eles classificam os planos de governo registrados no TSE como um “protocolo de intenções vazio”.
“Tenho interlocução com os dois lados e nenhum sinaliza nada fantástico”, disse Ricardo Lacerda, sócio do BR Partners, um banco de investimento. “Os dois programas [ao TSE] foram apresentados de forma muito cínica. Tudo é vago, só tem mais do mesmo [de ambos os lados]. A discussão ficou ideológica. O principal não está dado, quais serão as reformas, as medidas a serem tomadas.”
Por isso, nas últimas duas semanas, banqueiros e empresários partiram em busca de informações junto aos próprios candidatos para desvendar, ao menos, dois pontos cruciais: a proposta sobre uma nova âncora fiscal e o projeto para a retomada do crescimento econômico.
Nos encontros, ambos os candidatos e suas equipes mencionaram a necessidade de revisão do teto de gastos, medida que corrige as despesas de um ano pela inflação do ano anterior.
Para o mercado financeiro, com a perda do grau de investimento (selo de que o país é um destino rentável), em 2015, o teto passou a ser o principal indicador de que o país não se tornará insolvente ou gastador.
Três banqueiros afirmaram que Lula prometeu explicitamente pôr fim ao teto de gastos. No lugar, sua equipe estuda a criação de um mecanismo atrelado a um volume de gastos, que seria maior inicialmente e depois reduzido ao longo do mandato.
Nos encontros de representantes dos setores com Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, a proposta em avaliação é que a despesa possa crescer acima da inflação –flexibilizando a regra do teto–, quando o endividamento estiver próximo de 60% do PIB.
Muitos consideram o plano de Lula melhor porque seria mais eficiente no controle das contas públicas em longo prazo.
Para o empresariado, mais preocupado com a retomada do consumo e do crédito, o que chama a atenção no plano de ambos os candidatos é a promessa do uso de garantias concedidas por bancos públicos e fundos específicos para lastrear empréstimos bancários, especialmente para empreendedores de pequeno porte.
Lula afirmou para os empresários ouvidos pela Folha que vai turbinar o uso dessas garantias via BNDES e Banco do Nordeste, ambas instituições de fomento, Caixa e BB. Bancos comerciais também poderão usar essas garantias públicas para lastrear financiamentos próprios.
“Acho que é a única forma de esquentar a economia”, disse André Perfeito, economista-chefe da Necton, braço de investimento do BTG. “Não há recursos em caixa para subsídio via juros, como ocorreu no governo Lula. E esse programa de aval já está funcionando no governo Bolsonaro.”
Durante a pandemia, Bolsonaro aprovou o Pronampe, um programa de concessão de empréstimos para empresas com garantias dadas pelo Tesouro Nacional.
O programa teve forte adesão de bancos privados, servindo de motor do crédito durante a crise sanitária.
O Sebrae, que possui um fundo de aval chamado Fampe, também entrou nesse nicho. Depois, outra lei foi sancionada por Bolsonaro e criou o FGI, fundo de aval do BNDES.
A ideia dos avais –principalmente com dinheiro do Tesouro e do FGTS– é dar o pontapé inicial à roda do crédito. Uma vez que o primeiro passo for dado, os pagamentos mensais de um empréstimo concedido servem de garantia para novos empréstimos.
Para Lula, essa também será uma forma de reestruturar dívidas dos pequenos empresários. Segundo o ex-presidente, seu governo vai renegociar essas dívidas, especialmente para mulheres.
Estima-se que 55 milhões de mulheres, todas elas arrimo de família e donas de pequenos negócios, estejam endividadas.
As reformas necessárias para a volta de investimentos, especialmente de estrangeiros, ficaram a desejar nos planos apresentados, segundo o empresariado.
Lula ainda causa preocupação devido às declarações de seu partido (PT) de que poderá cancelar os efeitos da reforma trabalhista, que fez prevalecer o negociado (entre funcionário e empregador).
O ex-presidente defendeu nessas conversas reservadas com os banqueiros que manter a reforma em vigor. Anunciou, no entanto, “aprimoramentos” para dar mais peso aos sindicatos, hoje enfraquecidos demais na avaliação do petista.
Bolsonaro afirmou que irá manter a reforma já realizada e tentará deslanchar o programa da Carteira Verde e Amarela com incentivos para a formalização do trabalhador. Quem contribuir com a Previdência terá acesso a crédito com juros diferenciados em bancos públicos, por exemplo.
A reforma mais esperada pelo empresariado, a tributária tem, praticamente, o mesmo tratamento dado por Lula e Bolsonaro. Ambos prometem levar adiante medidas no Congresso que preveem a simplificação tributária, mas divergem na forma.
Bolsonaro quer fazer a reforma em fases: primeiro, a unificar os tributos federais para, depois, promover a junção com o ICMS. Essa estratégia, no entanto, fracassou no mandato em curso.
Lula defende levar adiante a PEC da reforma tributária em discussão no Congresso e defende a criação imediata do IVA, o imposto único que agrega os demais.
Ambos anunciam levar adiante a correção da tabela de Imposto de Renda da pessoa física. Lula quer isenção para aqueles que ganham até R$ 5 mil por mês e Bolsonaro para quem ganha até R$ 2.500.
Apesar das promessas, o empresariado ouvido pela Folha diz não acreditar nisso, já que será preciso engordar o caixa do Tesouro diante de um cenário que aponta para queda global de crescimento, com alta de inflação e juros.
Os empresários afirmam ter pouca informação concreta sobre os planos dos candidatos para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.
Lula e Bolsonaro também não deixaram claros alguns temas, como a cobrança da CSLL (Contribuição Sobre o Lucro Líquido), a abertura da economia, a redução de impostos na concessão de crédito e a incidência de imposto sobre lucros e dividendos.
Guedes vem defendendo publicamente o andamento de uma reforma do IR (Imposto de Renda) enxuta, reduzindo a tributação sobre as empresas e criando a taxação sobre dividendos.
A ideia é fazer uma espécie de minirreforma tributária que incluiria a redução da alíquota de IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica), dos atuais 34% para 30%. Além disso, os dividendos seriam taxados em 10% (hoje, eles são isentos).
Em relação à reforma administrativa, Lula sinaliza para a valorização do servidor, enquanto Bolsonaro promete enxugar a folha de pagamento do funcionalismo. (BN)