Relator da PEC do STF elogia Jaques Wagner por voto contra PT: ‘Capaz de conversar fora do cercadinho’

Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, Amin aponta a necessidade de rever outras prerrogativas de magistrados do Supremo, como o mandato vitalício.

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita os poderes do Supremo Tribunal Federal (STF), o senador Esperidião Amin (PP-SC), elogiou o voto favorável à proposta do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), e disse acreditar que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não deverá engavetar o texto. A bancada do PT era contra o texto.

Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, Amin aponta a necessidade de rever outras prerrogativas de magistrados do Supremo, como o mandato vitalício. “Não é notório saber, nem notável saber [jurídico]. É a perspectiva de ver este meu amigo ficar lá 35 anos”.

Em seu segundo mandato na Casa Legislativa, o ex-governador de Santa Catarina também avalia que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), não irá “engavetar” o texto aprovado no Senado. “Eu duvido que a Câmara seja indiferente a esta PEC”.

O relator elogia ainda o posicionamento do senador Jaques Wagner, que foi alvo de questionamentos por parte da base governista após votar a favor da PEC. “Eu gostaria de ter um líder assim, capaz de conversar fora do cercadinho, porque conversar com a minha tribo é fácil”.

Como o senhor recebe as declarações do decano do STF, ministro Gilmar Mendes, após a aprovação da PEC?

Eu recebo como uma manifestação política de alguém que está contrariado, mas eu tenho certeza que o ministro Gilmar Mendes, além de ser uma pessoa erudita, ele também vai ter seu momento de reflexão. Vai ver que a PEC respeita absolutamente o Supremo Tribunal Federal como instituição.

A PEC é precipuamente voltada para o seguinte: uma lei, aprovada pela Câmara, aprovada pelo Senado, pelo Presidente da República, pode ser expungida total ou parcialmente por inconstitucionalidade pelo colegiado do Supremo Tribunal Federal. Tiramos alguma prerrogativa do Supremo Tribunal? Não.

E sobre a manifestação do presidente do STF, Luís Roberto Barroso? O ministro classificou a PEC como um retrocesso e afirmou que as mudanças propostas não eram necessárias, uma vez que a Corte já havia feito alterações recentes para reduzir o peso das sentenças individuais.

Veja o Artigo 134 [artigo que trata sobre os pedidos de vista no Supremo]. Por favor, peça para dois juristas analisarem o artigo 134 do regimento. Peça para ver a emenda regimental número 58 para ver se eu estou certo ou estou errado. [Emenda número 58 modificou o art.134 e estabeleceu o prazo de 90 dias para a devolução de pedidos de vista feitos por ministros]. O que queremos é decisão do colegiado.

Eu também quero invocar o texto do [Luiz] Fux, quando ele pregou, eu não sou autor desta frase, a frase é ‘desmonocratizar o Supremo’. Essa expressão é do ministro Fux. Quando ele diz o seguinte, ‘o Supremo do futuro é um Supremo que sobreviverá sempre realizando apenas sessões plenárias’. ‘Será uma Corte em que sua voz será unívoca’. ‘Em breve’, dizia o ministro Fux, no dia 16 de outubro de 2020, ‘nós desmonocratizaremos o Supremo no futuro’.

Não há nenhuma ofensa, nem a ministra Rosa Weber, nem a qualquer ministra, nem ao presidente atual.

O senhor é a favor de outras medidas que limitem o poder dos ministros da Suprema Corte, como a PEC que estipula mandato fixo no STF?

Olha, nós estamos vivendo nos últimos 10 anos uma propensão para nomear amigos jovens, jovens amigos. Não chama atenção, isso não? Nos últimos 10 anos, houve preferência por nomear jovens. Para quê? Para que ficasse mais tempo no Supremo, né?

Então, isso chamou atenção. Porque não é notório saber, nem notável saber [jurídico]. É a perspectiva de ver este meu amigo ficar lá 35 anos.

O mandato deveria ser debatido. Eu acho que a idade nem precisa de lei, basta sensatez. Senão nós vamos com a indicação de um estagiário. Agora, quando ao mandato… Eu acho que é um tema interessante.

Mas eu te confesso que eu nem tenho uma posição, assim, definida. Como está hoje, uma possibilidade de nomear amigos jovens, eu acho que alguma coisa tem que ser feita.

Como o senhor avalia as críticas direcionadas ao senador Jaques Wagner após ele votar a favor da PEC?

O voto do senador Jaques Wagner é o voto que o governo mais precisa, porque ele comprova com isso que tem diálogo e merece o respeito de todos nós. O senador Jaques Wagner hoje tem o respeito da oposição, não porque ele pensa como nós, mas porque ele defende o lado dele, e nos respeita no diálogo. Neste caso, ele decidiu. Eu não tive coragem de pedir o voto dele; não tive coragem. Mas ele sempre teve o meu respeito, divergindo, mas respeitando. Como ex-governador, eu gostaria de ter um líder assim, capaz de conversar fora do cercadinho, porque conversar com a minha tribo é fácil. Agora, um líder que consegue ser respeitado, dialogar e ter a coragem de votar num caso desse, como votou…

É um líder de um governo que enfrenta contradições internas. Tem um partido muito sólido, que é o PT, mas tem uma coligação… E tem que ter o talento do Lula pra tocar, mas tem que ter a respeitabilidade de um líder como o Jaques Wagner. Olha, se eu fosse presidente, palavra de honra, eu queria ter um líder assim.

Há uma percepção entre grupos políticos e juristas que a aprovação da PEC, neste momento, é uma retaliação a temas sensíveis que foram julgados no STF, como a questão do marco temporal, aborto, descriminalização do porte de drogas, entre outros. Como o senhor avalia essa interpretação?

Aí, nós estamos entrando no campo da imaginação. Lembre-se que esta PEC foi apresentada em 2019. Ela não conseguiu os 49 votos em setembro de 2019. Em 2021, ela foi reapresentada. Ela poderia ser apresentada no mesmo ano, já desidratada.

Agora, temer retaliação…Às vezes, tem um pouco de complexo de culpa nisso. Eu acho que os que estão mais temerosos são aqueles que percebem ao seu lado que erraram muito.

Aliás, foi isso que o ministro Marco Aurélio disse ontem. Ele disse: ‘Cada vez que nós extravasávamos em nossos limites, eu dizia: Vem tronco aí’. E ele disse que avisava aos seus colegas: ‘Olha, vocês estão avançando o sinal. Vem tronco’. Eu não estou dando tronco nenhum. Eu estou relatando, com pureza de alma, modestos conhecimentos jurídicos. Eu sou advogado formado em 1970.

Portanto, a PEC é absolutamente respeitadora das instituições.

Então, quanto mais critérios nós tivermos, com mais clareza, e finalmente, a maior demonstração de respeito…. É, você tem alguma dúvida que nós respeitaremos uma decisão do STF se ele disser os artigos de tal e tal da lei das estatais são inconstitucionais? O que nós vamos fazer? Vamos corrigir.

Alas do Congresso avaliam que o STF atua com certo ativismo judicial, usurpando poderes do Legislativo. Qual a visão do senhor com relação a atuação do Supremo nos últimos anos?

Em 19 de outubro, na sessão de debates temáticos sobre a PEC, da qual participavam, entre outros, o jurista Nabor Bulhões, ele disse o seguinte: ‘Eu acho que vocês não deviam entrar nesse negócio de pedido de vista. Porque o próprio Supremo vai corrigir. Agora, dá privilégio para a decisão do colegiado. É o que nós, advogados, queremos. O Direito não pode caminhar na base de decisões monocráticas. A justiça não pode ser regida por decisões monocráticas, nem por pedidos de vista sem prazo. Mas a decisão monocrática é a pior, porque ela não é definitiva, produz efeitos e não se dá por colegiado’.

Então, o ativismo é uma coisa mais ampla, mas nesse caso é um ativismo negacionista porque é uma decisão que tranca o resto.

O ativismo judicial é muito mais complexo do que isso, mas eu quero focalizar sobre o prisma da PEC. A PEC não combate o ativismo judicial, ela valoriza a colegialidade.

Tendo em vista o número de decisões cautelares que ainda não tiveram o julgamento de mérito, até que ponto a regra de retroatividade prevista na PEC pode impactar e prejudicar a agenda da Corte?

Olha, vai impactar positivamente porque ela não é retroatividade, ela é atualidade.

Se tem uma lei, que a ministra Cármen Lúcia deu uma liminar que versa sobre distribuição de royalties de petróleo e ainda está em vigor. Isso não é retroagir, isso é atualizar. Eu até aceito que se discuta isso, mas quem está devendo não é o parlamento, nesse caso.

Quem deve, é quem tem que achar forma de pagar a sua penitência. Eu tenho certeza que o ministro Gilmar Mendes, eu tenho experiência, saberá como parcelar essa dívida que não é nossa, é da Corte. E não é da Corte Portuguesa, é da Corte do Supremo.

Qual a expectativa do senhor com relação a tramitação na Câmara dos Deputados?

Eu duvido que a Câmara seja indiferente a esta PEC. Na Câmara se reclama dessas decisões monocráticas mas se reclama com impotência porque a Câmara não tem instrumento para negociar isso com o Supremo Tribunal Federal ou com os tribunais.

Se não tramitar, o problema é deles. Eles é que vão ter que dar uma solução. Mas eu acho, conhecendo um pouquinho o espírito do deputado da Câmara… O que o Brasil tem ouvido sobre aborto, sobre droga e sobre marco temporal. Lá, sim, pode haver uma mistura de frustrações.

Mas eu tenho certeza que a Câmara dos Deputados, o Presidente Arthur Lira, terão sensibilidade para não engavetar algo que hoje, segundo o Instituto de Pesquisa, tem 66 % de aprovação.

O senhor teme a judicialização da PEC no próprio STF?

Nós estamos regulando matérias que são reguladas na Constituição. Por enquanto, quem muda a Constituição é o Congresso. Portanto, essa rapidez na declaração de inconstitucionalidade de uma matéria em tramitação mostra muito mais medo do que força.

Eu estou falando de legislação que não ofende ninguém, que representa equilíbrio entre poderes, que respeita, que não revoga nenhum direito do Supremo, mas aumenta a segurança jurídica da sociedade. Não depender de decisões monocráticas, especialmente para leis.

Eu estou lutando para dar segurança jurídica para o Brasil. Nenhuma fatia do poder do Supremo foi mexida. Pelo contrário, nós estamos dando prioridade à colegialidade.

Existe algum tipo de estudo ou levantamento que os senhores utilizaram para mostrar como são os sistemas judiciais de outros países com relação às decisões individuais de ministros de Cortes?

Foi uma das grandes contribuições de Nabor Bulhões. Ele disse: ‘O Supremo Tribunal Federal do Brasil é o mais empoderado de todos os seus equivalentes no mundo. Mas como colegiado, a decisão monocrática é uma subversão’.

O empoderado pelo constituinte é o Supremo Tribunal Federal. E alguns se apropriaram do poder que é do colegiado, para exercitar este poder de maneira individual.

Como o senhor avalia a atuação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, na tramitação da PEC?

Eu agradeço muito ao presidente Rodrigo Pacheco pela condução firme e serena. Ele tem mostrado muito equilíbrio. Eu não votei nele, votei no Rogério Marinho agora e na Simone Tebet da outra vez. Também queria agradecer a todos os líderes partidários. Mesmo aqueles que não concordaram comigo, me deram a oportunidade de conversar.

(Politica Livre)

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