Eles acionaram a Justiça e alegam que estado pagou sem os juros de mora do período
O professor Rubens Gualberto de Oliveira, de 59 anos, acordou nesta quinta-feira (29) com a expectativa de receber cerca de R$ 50 mil do pagamento do dinheiro do Fundo de Desenvolvimento da Educação Fundamental (Fundef), mas a realidade foi bem diferente.
Ao ver que só tinha caído R$ 19 mil na sua conta, o educador, de prontidão, acionou a Justiça. Quem também resolveu judicializar a questão foi a Associação Classista de Educação da Bahia (Aceb) e o Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Estado da Bahia (APLB) com a premissa de que o valor depositado foi abaixo do esperado.
“É um absurdo a gente receber menos, esse dinheiro é nosso direito. Para onde foi parar o restante do valor? O Governo não explica o que fez com essa verba, pra mim isso é roubo. Já acionei a Justiça e espero que essa questão seja resolvida o quanto antes”, declarou o professor Rubens Gualberto.
A Bahia começou nessa quinta-feira (29) a pagar R$ 1,041 bilhão dos precatórios do Fundef a 57 mil profissionais da educação. Os educadores beneficiados vão receber 90% do valor total a que têm direito, nesta primeira parcela. Os outros 10% serão pagos até dezembro. Ao todo, 84 mil profissionais devem receber o abono. Outras parcelas serão enviadas para a Bahia pela União em 2023 e 2024. O total da dívida chega a quase 9 bilhões.
O professor Rubens Gualberto de Oliveira questiona o valor e disse que já entrou na Justiça (Foto: Ana Albuquerque) |
Segundo o professor Marco Aurélio Farias, 49, a primeira parcela paga pela União à Bahia contém 40% do valor total da dívida, chegando a R$ 3,9 bilhões, com o valor principal devido, a correção monetária e os juros de mora (juros por atraso de pagamento). O educador explica que os profissionais têm direito garantido por lei de receber pelo menos 60% desse valor, o que daria R$ 2,4 bilhões para serem rateados entre os 84 mil beneficiários.
Acontece que o Governo da Bahia diz que fez a destinação de 80% dos recursos para mais de 84 mil docentes no estado, no entanto, questionado pela reportagem, o governo de Rui Costa não explicou como foi feito esse cálculo, por que a categoria recebeu bem menos que o esperado e de qual valor foi retirado esses 80%.
Os educadores alegam que o Estado retirou os juros de mora do cálculo, sendo que os juros representam 55% do total de R$ 3,9 bilhões. A presidente da Aceb, Marinalva Nunes, 58, foi uma das que recebeu menos, mas ela explica que a categoria já sabia que isso iria acontecer, visto que o Projeto de Lei que regulamenta o pagamento do dinheiro do Fundef foi aprovado sem os juros de mora.
“A gente já sabia que isso iria acontecer, mas entramos com processo na Justiça desde a aprovação do PL para que a gente receba o valor que é nosso por direito. Eu recebi 22 mil e eles me devem cerca de 11 mil”, relatou a presidente da Aceb.
A coordenadora em exercício da APLB, Marilene Betros, também informou que o sindicato já acionou a Justiça para cobrar o pagamento. “O Governo do Estado não explica como eles fizeram o cálculo para chegar ao valor que foi repassado para os professores. Nem o decreto de regulamentação e nem a lei falam que não pode pagar com os juros”, explicou.
Na aprovação do projeto na Alba, ocorrido no último dia 23, o deputado Adolfo Menezes, líder da Casa, afirmou que o pagamento dos precatórios com correção poderia acarretar em problemas jurídicos para o Estado relacionados ao período eleitoral. “O governador me disse, pessoalmente, que não poderia pagar [os juros] para não acarretar em uma improbidade administrativa. Ele não quer ter problemas futuramente. Então, já foi um grande ganho esses 80%. Se os professores acharem que têm mais direitos, a Justiça está aí”, disse.
O Governo do Estado foi procurado para responder sobre o pagamento do dinheiro dos precatórios do Fundef, se eles realmente não incluíram os juros de mora na conta, mas eles não responderam até o fechamento desta reportagem. Os professores acusam o Estado de não atuar com transparência quanto ao pagamento do dinheiro dos precatórios do Fundef.
Quem também recebeu o valor dos precatórios nesta quinta (29) foi a professora Gisélia Araújo, 48, moradora do município de Ibitiara, na região da Chapada Diamantina. Ela recebeu R$ 10.526 pelo tempo de trabalho e confessa não ter feito cálculos para saber quanto poderia ter recebido. “Não sei quanto deveria ter recebido, foi tudo mal resolvido, ninguém explica nada direito. Algumas associações estavam fazendo cálculos, mas não sabia se era confiável, preferi ficar no escuro mesmo”, contou.
Alguns professores estão fazendo o cálculo para saber quanto deveriam ter recebido dividindo o valor total que o Estado deveria ter repartido, que seria pelo menos 60% de R$ 3,9 bilhões, pelo número de meses e horas trabalhadas. A professora Gisélia, no entanto, admite que já era previsível que o Governo da Bahia não fosse realizar o pagamento total ao qual os professores têm direito. O Estado está depositando somente R$ 1,041 bilhão e não explica o que foi feito com o restante do dinheiro.
“Em um país e estado que não valoriza os professores, não foi surpresa alguma para mim não receber o que era nosso direito. O Sindicato dos Professores, APLB, aceitou a proposta do governador de pagar sem os juros, dessa forma não tem muito o que fazer. Não criei expectativas com relação a este dinheiro mas senti mais uma vez a injustiça com os professores”, afirmou.
Quem tem direito?
Os precatórios do Fundef são valores oriundos de julgamento judicial, no qual a União foi condenada a pagar a complementação das verbas do Fundef que deixaram de ser repassadas pelo Governo Federal para estados e municípios, entre 1998 e 2006, devido a um erro de cálculo.
Segundo o Governo do Estado, os beneficiários que não foram contemplados com o crédito neste momento vão receber a totalidade dos valores após a fase de atualização cadastral e de apresentação de requerimentos. Aqueles que já receberam 90% do total, vão receber os 10% restantes. O montante total a ser destinado aos 84 mil beneficiários será de R$ 1,4 bilhão.
Serão contemplados professores, coordenadores pedagógicos, diretores, vice-diretores e secretários escolares que ocuparam cargo público ou que estavam em emprego público, em efetivo exercício na educação básica da rede pública de ensino, no período de janeiro de 1998 a dezembro de 2006.
Também receberão os precatórios aqueles que ocupavam cargos comissionados do quadro do Magistério e professores contratados pelo Regime Especial de Direito Administrativo (Reda), que atuavam na educação básica no mesmo período.
Estão incluídos servidores ativos e inativos, além de herdeiros daqueles profissionais que se enquadram nos mesmos critérios. (Correio)